terça-feira, 11 de março de 2014

Sobre garis e escravos


Os trabalhadores de limpeza urbana da COMLURB - Companhia Municipal de Limpeza Urbana da cidade do Rio de Janeiro entraram em greve em pleno carnaval em 1º de março de 2014.

O motivo era o aumento salarial. Um gari recebe no Rio de Janeiro a quantia assustadora de R$ 803,00 mensais.

Os garis enfrentaram primeiro o próprio sindicato da categoria. Um sindicato pelego, como milhares que brotam em cada esquina, que não estão nem aí para os trabalhadores que representam. O sindicato pelego fez um acordo rebaixado e entregou a cabeça dos garis para o prefeito feitor Eduardo Paes (PMDB).

Depois os garis enfrentaram o prefeito Eduardo Paes, um legítimo senhor de engenho. Durante entrevista se colocou como se fosse um feitor e os garis seus escravos, ameaçando-os de demissão se não voltassem ao trabalho e afirmou que colocaria escolta armada para garantir o trabalho dos escravos, ops, garis.

E em outro enfrentamento, os garis da cidade do Rio de Janeiro enfrentaram uma outra entidade que está, na maioria das vezes, contra os trabalhadores: o judiciário trabalhista, que aplicou multa ao sindicato de R$ 50.000,00 para cada dia de greve e decidiu que os garis podiam ser demitidos por justa causa.

Mas os garis não se deram por vencidos. Mesmo com a multa, mesmo com o sindicato pelego tendo entregue suas cabeças na negociação, mesmo com a ameaça de demissão que o prefeito fez, mesmo com o judiciário trabalhista impedindo o direito de greve com ameaça de demissão e multa, eles continuaram a greve.

A direção pelega do sindicato continuou com a mesma sacanagem: afirmou que o sindicato era contra a greve!

No dia 06 de março de 2014, aconteceu a cena em que as máscaras caíram: os garis trabalharam na rua recolhendo lixo "escoltados" pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar, guardas municipais e por escolta particular contratada pela prefeitura. Nas palavras da grande mídia, para ter proteção. Nas palavras de qualquer um que saiba ler a letra "a", para obrigá-los a trabalhar sob mira de arma pesada. Quem entraria em greve, sob a mira das armas pesadas da polícia de choque?

Evidente que era para impedir o direito de greve e não para garantir o direito ao trabalho.

E a população veio em apoio maciço aos garis em greve.

Enfim, seria mais uma greve que o sistema não aceita de jeito nenhum, apesar de garantido na Constituição da República. Mas não é uma simples greve.

Esta greve é paradigmática:

a) Realizada por garis, que na concepção conservadora e preconceituosa do apresentador de televisão Boris Casoy "gari é o mais baixo da escala do trabalho";

b) Greve em pleno carnaval (o perigo das manifestações na Copa do Mundo de Futebol e o AI-5 de Dilma-PT);

c) Uma greve que tem o apoio da população;

d) Greve que enfrenta as decisões do judiciário trabalhista e

e) As máscaras caíram, pois os salários dos garis, as condições de trabalho e o trabalho forçado sob a mira de arma de fogo, se parecem muito com as condições dos escravos do século XVIII e XIX, sob a mira de arma de fogo do capitão do mato.

O sistema capitalista não é capaz de manter o mínimo de dignidade aos trabalhadores. Enquanto isto, na Bahia, em Salvador, na capital que mais tem negros no Brasil, os cordeiros passaram fome, mais uma vez, enquanto nos camarotes os milionários se divertiam.

Decididamente, o homem livre de hoje não é muito diferente do homem escravizado de ontem, principalmente se for negro, favelado ou gari, ou se for os três ao mesmo tempo.

Esta greve teve o papel de derrubar as máscaras de carnaval. O Brasil não é um país só de bunda e nem só de bundão. Os garis mostraram que é necessário lutar para ser livre e que só a luta faz a lei.  Lei... Lei..., Ah! Lei Áurea... Esquece...

Pedro Aparecido de Souza

07 de março de 2014




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