sábado, 5 de abril de 2014

Arena Pantanal dificulta a acessibilidade para cadeirante: uma obra de meio bilhão de reais padrão FIOFÓ


Cadeirante encontra dificuldades para assistir jogo na Arena


Servidor público relata dificuldades para filho mixtense assistir à partida inaugural




Arena Pantanal:Cadeira do rapaz ficou "abandonada" na área de circulação; jovem teve que ser carregado para uma cadeira













LISLAINE DOS ANJOS
DA REDAÇÃO
O que foi uma noite de alegria e emoção para uns, se transformou no fechamento decepcionante de uma saga enfrentada pelo servidor público federal, Nilson Fernando Gomes Bezerra, 41, e seu filho, F.G.B., 15, um adolescente portador de deficiência que depende de uma cadeira de rodas para se locomover.

Mixtense “roxo” desde pequeno, F. teve que se contentar, na noite de quarta-feira (2), com a narração do jogo entre Mixto e Santos por um rádio de pilha, mesmo estando dentro da Arena Pantanal (setor Leste), uma vez que não conseguiu espaço com seu pai no lugar reservado no estádio a pessoas com deficiência – que não permite acompanhantes.


Nilson relatou à reportagem doMidiaNews que as dificuldades para que o adolescente assistisse ao jogo começaram quando teve início a venda dos ingressos para a partida.

Como já tem o hábito de levar o filho para conferir de perto seus times favoritos desde que ele era pequeno – tendo sempre o acompanhado desde pequeno a diversos jogos do Mixto no antigo Verdão e também a jogos do São Paulo, no Morumbi (SP) –, o servidor contou que não esperava tantos empecilhos.

"Já fazia muitos anos que ele não assistia um jogo do Mixto, porque o Estádio Dutrinha tem baixíssima acessibilidade"
“Já fazia muitos anos que ele não assistia um jogo do Mixto, porque o Estádio Dutrinha tem baixíssima acessibilidade e, dessa forma, ele ficou muito ansioso ao ver essa grande oportunidade”, afirmou.

Segundo Nilson, as duas primeiras decepções ocorreram quando ele tentou comprar, no site produtor do evento, Mário Zeferino Produções, o ingressos para o filho, mas não havia essa opção, apenas a informação de que o jovem tinha direito a meia-entrada.

Na sequência, ele foi acompanhado do filho até a Casa de Festas do Shopping Goiabeiras, onde foi informado de que os ingressos para os Portadores de Necessidades Especiais (PNEs) seriam vendidos apenas na unidade da Galeria Itália, no Coxipó.

“Nos deslocamos então para a Galeria Itália e fomos informados que os ingressos de PNE poderiam ser obtidos somente nas bilheterias do Ginásio Aecim Tocantins. Essa foi a nossa terceira decepção”, afirmou.

Nilson relatou que ficou com medo de comprar seu ingresso e o da esposa no local e, depois, não conseguir comprar a entrada do filho, o que fez com que ele enviasse um e-mail para a Mário Zeferino Produções e para a Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo (Seocpa), responsáveis pelo evento.

Tony Ribeiro/MidiaNews
Adolescente passou por dificuldades para assistir à partida entre Mixto e Santos
“Eu jamais iria sem ele ao jogo”, disse.

A esposa de Nilson foi, então, ao ginásio Aecim Tocantins para retirar o ingresso do filho, que, segundo a Secopa, seria gratuito – o que realmente foi – e também retirou o ingresso do acompanhante, que também foi gratuito.

“Entretanto, agora que eu tinha o ingresso de meu filho e o meu ingresso, precisávamos comprar o ingresso de minha esposa. Mas, devido à grande demora na definição do ingresso de meu filho, os ingressos haviam acabado e tivemos que recorrer a um subterfúgio que eu acho repugnante, que foi comprar de um cambista. Paguei R$ 100 e essa foi a minha quinta decepção”, disse.

Barrado por um "amerelinho"


De acordo com Nilson, no dia do jogo ele seguiu, por volta das 16h30, para a casa de um parente que mora no Jardim Primavera – nas proximidades do Verdão –, onde imediatamente procurou um agente de trânsito para saber se, como transportava um cadeirante, poderia seguir de carro até o estádio.

“Ele disse que eu poderia, se tivesse o adesivo homologado pela SMTU [Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte Urbano]. Eu mostrei a carteira de pessoa com deficiência e a cadeira de rodas que estava no porta-malas, mas ele disse que não adiantava, pois ‘sem o adesivo homologado não entrava’”, relatou.

Nilson disse que decidiu “esquecer os aborrecimentos” e seguiu para o jogo a pé, na companhia de quase 20 familiares.

Arquivo Pessoal
Visão do adolescente foi obstruída por pessoas que ficavam de pé no local destinado aos deficientes
Mas, durante a revista da Polícia Militar, mais uma confusão: os policiais não queriam deixar seu filho entrar porque, no bolso da cadeira de rodas, foram encontradas duas chaves tipo “allen” e uma chave de boca, usadas para manutenção em caso de “travamento” que impeça a locomoção.

“O sargento que comandava a guarnição proibiu a entrada tomando as chaves. Ele disse que iria confiscar as chaves alegando que o estatuto do torcedor proibia e eu disse que a constituição permitia”, afirmou.

A discussão continuou, até que a polícia resolveu liberar a entrada, desde que as ferramentas seguissem na bolsa de uma das tias de Nilson. Dentro do estádio, porém, o servidor percebeu que, o local destinado aos cadeirantes não era sinalizado (chão pintado).

“Procurei um voluntário dizendo que meu filho deveria ficar naquele corredor. Então, perguntei onde eu sentaria e ele me indicou a ficar longe de meu filho, deixando-o sozinho naquele local de circulação. Como eu jamais faria isso, carreguei meu filho até as cadeiras convencionais, deixando a cadeira de rodas sozinha”, disse.

Segundo Nilson, no local destinado aos PNEs, mais um entrave: havia muitas pessoas em pé – inclusive uma voluntária – atrapalhando a visão das pessoas com deficiência, principalmente aquelas que, como F.G.B, não podiam fica de pé para assistir ao jogo.

"Infelizmente, meu filho e eu veremos os jogos da Copa [de Cuiaá] pela televisão. Vamos assistir apenas ao jogo em Belo Horizonte porque, infelizmente, em nossa terra nós não somos respeitados"
O servidor conta que procurou ajuda de voluntários, dos bombeiros – uma vez que as pessoas estariam obstruindo a saída de emergência – e dos policiais militares, mas que nada foi feito.

“Eles (PM) disseram para ‘eu ficar tranquilo porque estádio é assim mesmo e que eu não deveria me estressar. A partir daí eu resolvi parar de assistir o jogo, peguei meu rádio de pilha que estava sintonizado em uma estação que narrava o jogo e mudei para uma estação de música”, relatou.

Sem mais jogos na Arena


Nilson já havia comprado ingressos para assistir ao primeiro e ao último jogo da Copa do Mundo em Cuiabá, mas que irá devolver. Ele também comrou ingressos para assistir a um jogo das oitavas de final no Estádio Mineirão, em Belo Horizonte.

“Infelizmente, meu filho e eu veremos os jogos da Copa [de Cuiaá] pela televisão. Vamos assistir apenas ao jogo em Belo Horizonte porque, infelizmente, em nossa terra nós não somos respeitados”, afirmou.

Nilson conta que, como o filho faz tratamento na Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) em São Paulo, regularmente leva o filho ao Morumbi para assistir ao segundo time de coração, onde sempre foi bem tratado e pode se sentar ao lado do filho.

“Esperávamos que aqui em Cuiabá poderíamos, a partir da inauguração da Arena, ter conforto e segurança ao menos parecido com o que encontramos no Morumbi,que é um estádio antigo. Hoje posso dizer com toda a segurança que tenho saudades do meu querido Verdão, pois nele eu podia ficar, sem nenhum estresse, ao lado de meu filho. Eu era feliz e não sabia”, disse.

Outro lado


Ao saber do ocorrido, a reportagem do MidiaNews procurou membros da assessoria da Secopa dentro do estádio, que confirmaram não haver espaço destinado aos acompanhantes dos PNEs.







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